O universo espiritual da pólis, por Jean-Pierre Vernant

Da pólis:
  • O advento da pólis se dá entre os séculos VIII e VII a.C., marcando uma invenção histórica que revolucionará a sociedade grega.
  • Um novo sistema de organização social que se desenvolvera até os dias atuais.

Da palavra:
  • No novo regime social, a palavra passou a ser uma ferramenta política de persuação, domínio e poder.
  • Transformada em divindade: Peithó, o poder de persuasão.
  • A palavra deixa de estar presente apenas em rituais religiosos, não mais sendo um termo pronto, mas agora o meio de julgamento e escolha.
  • As questões de interesse geral que cabiam ao Soberano eram agora submetidas à arte oratória e eram resolvidas por debate.
  • A relação entre política e logos se dá de forma recíproca: a arte política é essencialmente o exercício da linguagem; e a palavra tomou consciência de só e de seu poder através da política.
  • A retórica e a sofística possuem análises de forma de discurso, como instrumento de vitórias nas lutas da assembléia e do tribunal.
Da publicidade:
  • Dada às manifestações mais importantes da vida social.
  • Talvez se diga que a pólis existe até o ponto em que se distingue um domínio público.
  • Em benefício de todos, passou-se a observar condutas, processos s conhecimentos de níveis como basileus e das genes.
  • O acesso ao mundo espiritual (antes reservado para uma aristocracia guerreira e sacerdotal) é aberto para o depois todo, constituindo a cultura grega.
  • A epopeia homérica se faz de exemplo: antiga poesia de corte que saiu dos palácios e transpôs-se em poesia de festa.
  • Essa transformação acarretou grande consequência: o que antes era considerado sagrado e cultural, como conhecimento, valores e técnicas mentais, são levados à discussão e amplamente questionados. Deixam de ser tradições familiares conservados para serem geradores de debates. Doravante, a discussão, a argumentação e a polêmica tornam-se as regras do jogo intelectual, assim como o da política.
  • A publicidade também afeta outros aspectos da vida social, como a crença e a religião. Antigos deuses, símbolos, brasões ou objetos considerados talismãs saem dos palácios e fundos de casas sacerdotais, migrando para a morada pública. Os ídolos perdem seu caráter secreto, sua virtude de símbolo eficaz. Se tornam "imagens" sem outras funções nos rituais a não ser serem vistos.

Da escrita:
  • A palavra e usada como instrumento da vida política. É a escrita que vai dar o meio de uma cultura comum permitir uma completa divulgação de conhecimentos, por ela ter se tornado o bem comum de todos os cidadãos, quase com o mesmo direito da língua falada.
  • As mais antigas inscrições em alfabeto grego mostram que desde o século VIII a escrita não se trata mais de um saber especializado reservado aos escribas, mas uma forma de comunicação amplamente difundida ao demos.
  • Quando os indivíduos decidiram externalizar seu saber por meio de escrita, seja como forma de livro ou outro, seu desejo não era distribuir por escrito uma descoberta ou opinião pessoal. O que é intentado ao depositar a mensagem é fazer dela um bem comum da cidade, sendo também uma forma de se impor.
  • A redação de leis era feita para assegurar-lhes permanência e fixidez. O dever saiu das mais dos basileus, cuja função era "ditar" o direito, e tornaram-se um bem comum, uma regra geral, suscetível a ser aplicada a todos igualmente.
  • Uma vez publicada, a mensagem dos indivíduos toma um novo conceito e objetividade: faz-se dela uma verdade. Não se trata mais de um segredo religioso, foi destacada do círculo fechado das seitas para ser exposta em plena luz da cidade inteira. Isso significa que deve-se aceitar que a mensagem em questão vai poder ser submetida a debates políticos e julgamentos, nesse ínterim podendo ou não ser aceita e reconhecida por todos.

Da isonomia:
  • Conceito formulado no século VI, isonomia diz, quer conceito quer definição, que vem a ser igual a participação de todos os cidadãos no exercício de poder.
  • Antes de adquirir esse valor democrático, o ideal de isonomia servia para definir um regime oligárquico em que a arché é reservada a um pequeno número, mas é partilhada de maneira igual entre todos os membros dessa elite.
  • Os que compõem a cidade, por mais diferentes que sejam por sua origem, classe ou função, aparecem de uma certa maneira semelhantes uma aos outros.
  • Essa semelhança cria a unidade da pólis, porque, segundo os gregos, só semelhantes podem encontrar-se unidos pela philia, associados na mesma comunidade.
  • O vínculo de homem para homem vai agora substituir o antigo de submissão e domínio, com um novo tipo de relação recíproca e reversível.
  • Homoioi e isoi são dois conscritos que significam semelhança e diferença, como se definiram todos os participantes do estado.
  • Os cidadãos se concebem, no plano político, como unidades permutáveis no interior do sistema que tem por lei o equilíbrio e por norma a igualdade.

Resumo de:
VERNANT, Jean-Pierre. As origens do pensamento grego. 7. ed. Rio de Janeiro: Editora Difel. 2002.

1 comment

João Paulo | 21 de novembro de 2018 às 11:12

Obrigado. Serviu de grande ajuda em meus trabalho.

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